segunda-feira, 22 de março de 2010


Canção sobre Rimbaud

"Enivré à la pisotiére
à la pisotiére
à la pisotiére
de l'auberge amoureux de la bourrache
et que dissout,un rayon !"
( Les délires- Arthur Rimbaud )


Escrevi uma angustiante canção para tenor ( recitativo e canto ) e violão quando conheci o texto do poeta francês Arthur Rimbaud e me empolguei com suas possibilidades e as da língua francesa.

Ao mesmo tempo que o tema,dava margens para alusões óbvias ( de imagens e sons )procurei ressaltar, também sutilezas outras que o mundo da loucura proporciona : novas funções musicais, que até certo ponto podem soar banais, mas que revelam a vontade extremada do encontro consigo mesmo.

Do aspecto musical, o violão é lembrado como o instrumento mais íntimo, mais sutil e reservado. E por outro lado, o instrumento, que dá voz aos seresteiros noturnos, aos bêbados, aos desesperados e aos revolucionários. O tenor ; voz masculina mais popular no repertório lírico; é contrariada, por que imposta à um recitativo violento e desvairado. A idéia do delírio começa com a proposta de um compasso menos comum em música ( 3/8 ), o recitativo do tenor ( rítmico, sem indicação de notas ) e um violão sutilmente melódico-harmônico-atonal ( que se guia pelos trastes do violão em movimento ascendente, mantendo uma montagem de dedos ; e cuja proposta é a do termo aleatório : jogo de azar determinado pelo acaso ).

Como os acordes ascendem as casas do violão sem uma conexão tonal entre um e outro, o instrumento presta-se ao atonalismo. Um solo no violão, antecipa um momento de lucidez, que o tenor entoa em 13 notas dós repetidos. Retorna a liberdade tonal da voz e, um violão, grave e indeciso ( oscilando entre batidas forte/fraca ) encerra a composição.

Aldo Moraes
Publicado em 1997 no Jornal Aliança Francesa

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